O ESPAÇO DO CONTO A “ESCRITA DO DEUS”
Este trabalho tem como objetivo,
analisar o espaço do “conto a escrita do Deus”, de Jorge Luís Borges, nascido em Buenos Aires , em 24
de agosto de 1899, foi um escritor, poeta, tradutor, crítico e ensaísta, aos
nove anos, escreveu seu primeiro conto, “La visera fatal”, inspirado em um
episódio de Dom Quixote. Suas obras se destacam por abordar temáticas como
filosofia, metafísica, mitologia e teologia, em narrativas fantásticas onde
figuram os “delírios do racional” (Bioy Casares), expressos em labirintos
lógicos e jogos de espelhos.
O conto a “Escrita do Deus”, é
autodiegético, pois está narrado na primeira pessoa, quem conta a história é o
personagem progagonista, “Perdi o número dos anos que estou na treva”. Fazendo uma leitura desse conto, usamos
como categoria de análise o “espaço” da teoria da narrativa, que pode ser
definido como a categoria da narrativa onde circulam os personagens e onde se
desenvolve a ação (ABDALA JR., pg. 48). Existem ainda, três tipos de espaço, o
social (onde circulam os personagens), o físico (onde descreve o ambiente) e o
psicológico (como o personagem se situa nesse espaço).
Podemos observar nesse conto, que
existem dois tipos de espaço, o físico, “O cárcere é profundo e de pedra; sua forma é a de um hemisfério quase
perfeito, embora o piso (também de pedra) seja algo menor que um círculo
máximo”, “Um muro corta-o pelo meio; este apesar de altíssimo, não toca a parte
superior da abóbada; de um lado estou eu, Tzinacan, mago da pirâmide de
Qaholom, que Pedro de Alvarado incendiou; do outro há um jaguar, que mede com
secretos passos iguais o tempo e o espaço do cativeiro. Ao nível do chão, uma
ampla janela com barrotes corta o muro central, Na hora sem sombra (o
meio-dia), abre-se um alçapão e um carcereiro que os anos foram apagando
manobra uma roldana de ferro, e nos baixa, na ponta de um cordel, cântaros de
água e pedaços de carne. A luz entra na abóbada; nesse instante posso ver o
jaguar”. E o espaço psicológico, “fato que de algum
modo agrava os sentimentos de opressão e de grandeza”, “Gastei noites inteiras lembrando a
ordem e o número de algumas serpentes de pedra ou forma de uma árvore
medicinal. Assim fui vencendo os anos, assim fui entrando na posse do que já
era meu”.
Nesse conto temos uma história que se
passa em uma prisão, uma espécie de porão, onde Tzinacan via claridade apenas ao
meio dia, quando o carcereiro manobrava uma roldana de ferro, e baixava em um
cordel, água e carne, ele tinha como companhia, apenas um jaguar que estava no
cárcere ao lado. A prisão representa, não apenas a falta de liberdade física,
mas também psicológica, vemos o personagem em constantes conflitos, não
lembrava mais a quantidade dos anos que estava ali, sabia apenas que um dia
fora jovem, ”Perdi o número dos anos que estou na treva e podia caminhar nesta
prisão”, vivia apenas de recordações e consolava-se pela esperança
de que Deus não o teria abandonado “Premido pela fatalidade de fazer
algo, de povoar o meu tempo, quis recordar, em minha sombra, tudo que sabia”.
Temos um conflito durante todo o conto, sobre um mistério, que o personagem
acredita que foi escolhido por Deus para guardar, mas, apesar de várias pistas
no decorrer do conto, é apenas no último parágrafo, que vemos, que tudo isso, é
ele no seu delírio de morte.
“Que morra comigo o mistério que está
escrito nos tigres. Quem entreviu o universo, quem entreviu os ardentes
desígnios do universo não pode pensar num homem, em suas triviais venturas ou
desventuras, mesmo que esse homem seja ele. Esse homem foi ele e agora não lhe
importa. Que lhe importa a sorte daquele outro, que lhe importa a nação daquele
outro, se ele agora é ninguém? Por isto não pronuncio a fórmula, por isso deixo
que os dias me esqueçam, deitado na escuridão”.
Vemos nesse conto muitos conflitos
psicológicos, prisão, escuridão e noite, simboliza morte, conflito interior.
Enquanto, que luz, mar e águas podem simbolizar paz, tranqüilidade, passagem da
morte para vida, tanto física, quanto psicológica. Muitas pessoas vivem, sempre escondendo algo,
ou se escondendo de alguma coisa, presas em seu mundo, não conseguem enxergar o
que está à sua volta, aceitando o que lhe são impostas. Vemos através desse
conto o quanto o ser humano vive em conflito consigo mesmo, preso em seus
próprios desejos, vivendo para o seu trabalho e seus interesses pessoais,
esquecendo que a vida é bela, e também as lembranças que um dia foram livres e
sonhadoras. As pessoas estão sufocadas pelas suas próprias ambições e
ganâncias, o que explica, porque o mundo vive em densa escuridão, com tanta
violência, desamor e falsidade, esquecendo os valores morais e a preocupação
com seu semelhante. Se todos acreditassem, assim como Tzinacan, que Deus não os
abandonara, talvez muitas noites se tornassem dias, a esperança renasceria e o
mundo tornar-se-ia melhor.
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