CHAUÍ,
Marilena. Mito fundador e sociedade
autoritária. 6ª reimpressão. Fundação Perseu Abramo. São Paulo. 2006.
No texto
percebe-se que a autora vem levantar as indagações de quando e como se
construiu o mito de ter orgulho de ser brasileiro? E qual o papel que essa
idéia desempenha em nosso país, na capa do livro já inicia com uma pergunta
pertinente que vale a pena ressaltar, no momento em que o Brasil é incitado a
festejar os seus 500 anos, há realmente o que se comemorar?
Essas e outras
questões são levantadas no texto, que possui uma linguagem simples, para quem
já tem algum conhecimento prévio e essa leitura busca nos aproximar de uma
visão mais abrangente da história brasileira.
No decorrer do
texto observa-se que a autora vai relacionar vários acontecimentos históricos,
que vai desde a colonização até a independência do Brasil. Percebemos que no
texto ocorre uma intextualidade e a interdisciplinaridade, pois o mesmo faz
muitas referências a outros textos e contextos históricos que exige um conhecimento
prévio de leitura, pois se não há tivéssemos não conseguiríamos entendê-lo.
No capítulo “Com
fé e orgulho” Marilena faz uma retrospectiva de tudo o que aprendemos desde
cedo na escola, que é a valoração a nossa nacionalidade e o significado de
nossa bandeira.
De acordo com o
texto todos nós fazemos nossas as palavras daquele que é considerado o primeiro
brasileiro do Brasil, Rocha Pita, quando, em 1730, escreveu:
[...] “Em nenhuma
outra região outra região se mostra o céu mais sereno, nem de madruga mais bela
a aurora; o sol em nenhum outro hemisfério tem raios tão dourados, nem os
reflexos noturnos tão brilhantes; as estrelas são mais benignas e se mostram
sempre alegres [...]”.
Aqui o autor Rocha
Pita citado pela autora Marilena, ressalta esse nacionalismo brasileiro,
colocando como se o Brasil fosse o melhor país do mundo e a mesma evoca
bastante o hino nacional.
Nesse primeiro
capítulo a autora vai lá às nossas origens para que possamos entender o porquê
de nos sentirmos orgulhosos de sermos brasileiros.
[...] “Sabemos
todos que somos um povo novo, formado pela mistura de três raças valorosas: os
corajosos índios, os estóicos negros e os bravos e sentimentais lusitanos. Quem
de nós ignora que da mestiçagem nasceu o samba, no qual se exprimem a energia índia,
o ritmo negro e a melancolia portuguesa? Quem não sabe que a mestiçagem é
responsável por nossa ginga, inconfundível marca dos nossos campeões mundiais
de futebol? [...]”.
No decorrer da
leitura a autora aborda outros questionamentos, que por sermos mestiços,
desconhecemos preconceito de raça, cor, credo e classe?
No texto são citadas
duas pesquisas, que foram realizadas em 1995, no qual o objetivo de pesquisa
era saber se os entrevistados sentiam orgulho de ser brasileiros e quais os
motivos de orgulho. O resultado da pesquisa afirma que 60% sentiam orgulho e
que apenas 4% disseram sentir vergonha. E um dos motivos por serem orgulhosos é
a natureza, o caráter, esportes, música, carnaval, trabalhador, alegre e
outros...
No último
parágrafo deste capítulo vemos ser abordada uma crença generalizada do que o
senso comum diz sobre o Brasil e não é tão difícil de compreender porque é um
assunto próximo da nossa realidade, ao qual convivemos e ouvimo-la
constantemente.
O Brasil “é um dom
de Deus e da natureza”; tem um povo pacífico, ordeiro, gênero, alegre etc. No
mesmo capítulo é levantada uma contradição levantada por esse mesmo “senso
comum”, quando vemos em ação, isto é, quando resolve imaginariamente uma tensão
real e produz essa contradição que passa despercebida. “É assim, por exemplo,
que alguém pode afirmar que os índios são ignorantes, os negros são indolentes,
os nordestinos são atrasados etc.”
É a partir desses
questionamentos, que nos aprofundaremos no “Mito fundador”. A palavra mito de acordo com o texto “não será
apenas no seu sentido etimológico de narração pública de feitos lendários da
comunidade (isto é, no sentido grego da palavra mythos), mas também no seu
sentido antropológico, no qual essa narrativa é a solução imaginária para
tensões, conflitos e contradições que não encontram caminhos para serem
resolvidos no nível da realidade”.
A palavra
“fundador” é utilizada porque é à maneira de como esse mito impõe um vínculo
interno com o passado como origem, isto é um passado que não cessa nunca. Ou
seja, algo que perpassa o tempo, gerações. Esse mito que não cessa, sempre
encontra novos meios de se manifestar, utilizando novos meios, novas
linguagens, valores e idéias.
Marilena aborda a
noção como semióforo para designar tipos de relíquias e oferendas, os espólios
de guerra, as aparições celestes, os meteoros, certos acidentes geográficos,
certos animais, os objetos antigos, os documentos raros, os heróis e a nação.
“[...]Semeiophoros
é uma palavra grega composta de duas outras: semeion “sinal” ou “signo”, e
phoros, “trazer para a frente. Como semáforo, era um sistema de sinais para a
comunicação entre navios e deles com a terra. Como algo precursor, fecundo ou
carregado de presságios, o semióforo era a comunicação com o invisível, um
signo vindo do passado ou dos céus, carregando significação com conseqüências
presentes e futuras para os homens [...]”.
“[...] Com esse
sentido, um semióforo é um signo trazido à frente ou empunhado para indicar
algo que significa alguma coisa e cujo valor não é medido por sua materialidade
e sim por sua força simbólica. [...].”
Como foi citado
anteriormente, um semióforo é, pois, um acontecimento, um animal, uma pessoa
retirados do circuito do uso ou sem utilidade direta e imediata na vida
cotidiana porque são coisas providas de significação ou de valor simbólico,
capazes de relacionar o visível e o invisível, seja no espaço, seja no tempo,
pois o invisível pode ser sagrado (um espaço além de todo espaço) ou o passado
ou o futuro distantes (um tempo sem tempo ou eternidade), e expostos à
visibilidade, pois é nessa exposição que realizam sua significação e sua
existência. É um objeto de celebração por meio de cultos religiosos,
peregrinações a lugares santos, representações teatrais de feitos históricos,
comícios e passeatas em datas públicas festivas, monumentos; e seu lugar deve
ser público: lugares santos (montanhas, rios, lagos, cidades), templos, museus,
bibliotecas, teatros, cinemas, campos esportivos, praças e jardins, enfim, locais
onde toda a sociedade possa comunicar-se celebrando algo comum a todos e que
conserva e assegura o sentimento de comunhão e de unidade.
No texto também é
ressaltado que no modo de produção capitalista não pode haver semióforos, pois,
no capitalismo, não há coisa alguma e pessoa alguma que escape da condição de
mercadoria.
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